sábado, 10 de janeiro de 2009

Soberania sem fundo

Por VINICIUS MOTA, Folha:
SÃO PAULO - Esqueça a propaganda oficial. O Brasil não possui nada parecido com um fundo soberano. O que foi criado numa gambiarra legal, no dia 26 de dezembro, é um ser amorfo, que tenta escapar aos controles institucionais.
A armadilha contida no nome da criatura, denominada Fundo Soberano do Brasil, lembra o Fundo Social de Emergência, criado nos primórdios do Plano Real: não tinha nada de "fundo" nem de "social", muito pelo contrário. Ficava só na emergência mesmo; emergência para fechar as contas.
Fundos soberanos são constituídos com poupança. Poupança, com perdão da obviedade, é o dinheiro que sobra após a liquidação de todos os gastos. O setor público brasileiro fica no vermelho depois de saldadas todas as suas contas.
Não vale invocar o "superávit primário" do governo. Essa é uma poupança intermediária, que desconsidera as despesas financeiras. Quando os gastos com juros são computados, faltam recursos para tapar o buraco. Faltaram cerca de R$ 35 bilhões, nos 12 meses terminados em novembro, que foram tomados de empréstimo no mercado.
O governo brasileiro, portanto, endividou-se mais para dotar o novo fundo. Num contexto de crise, faz sentido relaxar o freio sobre a dívida pública e privilegiar investimentos em infraestrutura? Com uma série de condicionantes -a começar da necessidade de diminuir, também, a marcha das despesas de custeio da máquina estatal-, minha resposta seria afirmativa.
O que as pessoas pensam a respeito do tema é menos importante, contudo, do que a necessidade de uma decisão desse teor passar pelo crivo do Congresso. O Legislativo lavou as mãos e aprovou um fundo sem fundos. O governo fez pior e editou uma medida provisória que o autoriza a endividar-se sem limites para constituir o fundo e a aplicar os recursos onde bem entender. Tanta soberania precisa de freio.

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